Uma das características mais espontâneas dos bebês é que, durante um tempo surpreendente, eles não têm noção de que a mãe é outra pessoa. Para eles, ela parece ser um mero apêndice de seu próprio ser, uma extensão de si mesmos, sem distinção clara entre o “eu” e o “outro”. Essa ilusão, tão presente no início da vida, não desaparece completamente na vida adulta, e, de certa forma, ainda nos acompanha em nossos relacionamentos. Podemos demorar a reconhecer que o ser amado não está ligado à nossa alma por um cordão umbilical, que ele não é uma extensão de nós mesmos, mas, sim, um “outro” distinto, com suas próprias experiências, pensamentos e subjetividade.
Nos relacionamentos íntimos, essa ideia de fusão pode persistir de forma subliminar. A psicanálise nos ensina que o ser amado, por mais próximo que esteja, nunca será totalmente idêntico ao sujeito. Ele sempre será uma pessoa com sua própria individualidade, suas particularidades e diferenças. Isso implica que o amor não envolve apenas uma fusão ou uma idealização do outro, mas também o reconhecimento da sua alteridade — ou seja, da diferença e da separação entre o “eu” e o “outro”. Em um amor maduro, há uma compreensão de que o outro é alguém distinto, não um espelho que reflete as nossas carências e desejos.
No entanto, o sujeito que ama muitas vezes tende a idealizar o outro, projetando nele seus próprios desejos e necessidades. Ele pode esperar que o ser amado corresponda a uma imagem de perfeição, moldada a partir de suas próprias carências emocionais. Esse processo de idealização é uma tentativa de preencher a falta que o sujeito sente em si mesmo, muitas vezes esperando que o outro atenda às expectativas de um amor idealizado, que não corresponde à realidade do ser amado.
Essa dinâmica é explorada por Marcel Proust em Em Busca do Tempo Perdido, onde o personagem principal se apaixona por várias mulheres. Porém, suas relações são sempre marcadas pela percepção de que ele as ama não como elas realmente são, mas como ele as projeta, com base em seus próprios desejos e fantasias. A figura da amada, idealizada e colocada em um pedestal, acaba se distanciando da realidade, e seu verdadeiro ser se torna, na maioria das vezes, inacessível. O ser amado, assim, nunca é o mesmo que a imagem que criamos dele, e esse distanciamento entre a projeção e a realidade gera um sentimento de insatisfação e frustração.
No fundo, essa busca incessante por um amor perfeito e idealizado nos leva a um paradoxo: quanto mais tentamos fundir nosso ser ao do outro, mais nos afastamos da verdadeira intimidade, que só pode existir quando reconhecemos e respeitamos a alteridade do outro. Esse é o desafio do amor, que envolve não só o desejo de união, mas também a aceitação da separação e da diferença, compreendendo que o ser amado não é, e nunca será, uma extensão de nós mesmos.